João Caetano
em
Jul 15, 2023
Como definir a atratividade de uma loja?

Na Teoria do Lugar Central publicada por Walter Christaller em 1933 e chave da metodologia da Mapfry havia o conceito de Alcance, que discutia até onde um ponto será relevante para uma população e em qual ponto haverá desinteresse em se deslocar para adquirir qualquer artigo ou serviço.

Dentro da área de Alcance acontece a contagem populacional para medir se o volume de pessoas é grande o suficiente para justificar uma operação comercial, esta contagem foi chamada de Limiar, a população mínima proporcional para cada segmento de negócio.

Esses dois conceitos foram consolidados na Área de Influência, o tema mais espinhoso do Geomarketing.

Até qual distância os clientes vão se considerar atendidos por uma loja e a partir de qual ponto vão buscar outras alternativas?

O desafio aqui é, quem imagina ter uma área grande demais, considera potencial que não tem. 

Quem é muito conservador e prefere subdimensionar, ignora possíveis clientes e se posiciona mal em relação a eles.

Esse é o verdadeiro problema da definição da área de influência, não dá pra errar nem pra mais nem pra menos.

Então como fazer para acertar no alvo?

A técnica mais consolidada é o mapeamento de clientes.

Nela, usando o recurso de importação de endereços para o mapa, será possível visualizar as distâncias percorridas pelos clientes mais assíduos e assim estimar a influência que um ponto comercial está exercendo sobre a região.

Pontos numa tela

Mas, nem sempre temos informações de clientes, seja porque a loja ainda não foi inaugurada ou está num ramo em que não é comum fazer cadastro de endereço.

A verdade é que nossa mente pode ser treinada para realizar estimativas muito realistas

Para isso, vamos usar uma metodologia bastante conhecida, a pirâmide de Maslow.

Desenvolvida pelo psicólogo norte americano Abraham Maslow como Teoria da Motivação Humana, foi resultado de uma pesquisa sobre o que deixava as pessoas felizes.

Em seus estudos ele pôde observar que novos desejos surgiam assim que os anteriores eram satisfeitos. 

E tais desejos seguiam uma ordem comum a todos os seres humanos:

Primeiro temos que atender às necessidades básicas, comer, dormir, ir ao banheiro. 

Tão logo atendemos a essas necessidades, uma nova prioridade se forma, é preciso garantir meios para não sejamos vulneráveis à falta de qualquer necessidade básica.

Portanto, vamos em busca de uma casa com quarto e banheiro, de um armário com alimentos, roupas. 

Para manter essas necessidades básicas, vamos precisar de dinheiro, então também será necessário que esta casa esteja num local que permita acesso a atividades remuneradas e a mercados onde poderemos adquirir alimentos e tudo mais.

A partir da segurança de que nossas necessidades básicas não estão em risco, o próximo desafio será pertencer a um grupo.

O forte desejo de fazer parte de algum círculo de amizade e companheirismo pode nos fazer esquecer que, em alguns momentos atrás, estávamos com fome e frio, mas é assim que somos.

Uma vez dentro de um grupo, começa um esforço para ir além do pertencimento, é a busca pelo reconhecimento, uma posição de destaque e respeito entre os seus.

Por fim, a necessidade humana mais elevada é o que Maslow chamou de realização pessoal.

Aqueles que alcançam esse estágio podem declarar que fazem o que amam. 

“Um poeta deverá escrever, um artista pintar, um músico compor e performar, só assim poderão se considerar plenos e felizes”

“Uma pessoa deve ser aquilo que ela sente que foi feita para ser”

E o que isso tem a ver com a área de influência de um negócio?

Tudo!

Nossas necessidades básicas nos pressionam todos os dias, precisamos dormir, ir ao banheiro, comer e beber.

Portanto, os meios para satisfazer nossas necessidades básicas devem estar próximos de nós.

Dentro de casa ou nos chamados “mercados de vizinhança”, que existem para abastecer-nos com recursos essenciais.

Quanto mais vamos nos afastando das necessidades básicas, maiores as distâncias que podemos percorrer para alcançar as necessidades seguintes.

Alguém pode passar o dia na rua e só ir para casa à noite, usando-a essencialmente para dormir, uma vez que já foi ao banheiro, se alimentou e até tomou banho em algum ponto de sua jornada. 

Outra pessoa pode usar um meio de transporte para chegar ao clube onde é membro ou agremiação religiosa da qual faz parte.

Tanto pertencer a um grupo, quanto o reconhecimento dele, são sentimentos que não precisam ser reforçados a todo momento (há exceções), portanto podem estar mais distantes. 

O topo das necessidades humanas pode estar bem longe de onde você vive.

Veja o caso do livro e filme Comer, rezar, amar

Nele, Liz Gilbert parte em busca de sua realização mais elevada:

“Eu quero ir a algum lugar onde eu possa me maravilhar”

Comer, Rezar, Amar (trilha sonora) - Playlist - LETRAS.MUS.BR

Expressando esse desejo ela sai de sua geografia local e começa uma jornada em busca de autoconhecimento, paz interior e felicidade que a leva a lugares tão distantes quanto Itália, Índia e Indonésia.

Filmes e séries estão cheios de histórias que se movimentam no sentido de os personagens conquistarem algum degrau da hierarquia de Maslow.

A luta para atender às necessidades básicas

Walking dead 

The Walking Dead chega ao fim; veja como assistir à temporada 11
Negan, personagem de The Walking Dead Foto: Divulgação/Star+

Tramas de zumbis, ou algum outro evento terrível que não acaba com a humanidade, mas leva à quebra de todos os pactos civilizatórios, são histórias de luta pela sobrevivência.

Encerram-se as expectativas de retribuição futura, a confiança no dinheiro, todas as redes de relacionamento que articulam a enorme complexidade da vida moderna. 

As regras sociais foram esquecidas, é cada um por si na disputa pelos recursos essenciais à vida.

Essa situação desperta o egoísmo e a fúria bestial, podendo transformar um ex-professor e vendedor de carros usados no líder de uma gangue pós-apocalíptica. 

Os zumbis são pretexto para contar uma história em que pessoas normais estão extremamente vulneráveis em suas necessidades mais essenciais.

Naturalmente, as melhores histórias não são tão limitadas e podem explorar necessidades em várias escalas.

As pessoas se voltam às suas necessidades básicas.

Água, comida, descanso.

Uma vez atendidas, elas vão levar a uma nova necessidade, o desejo de proteger as necessidades básicas num horizonte próximo. 

Sozinhos somos incapazes, vamos em busca de um grupo.

O grupo vai cobrar alguma contribuição e nos dar de volta os meios de vida daquela comunidade.

Em algum momento, os interesses de nosso grupo podem entrar em choque com os interesses de outro grupo. 

Daí vamos pensar: 

“Temos que prevalecer, nossos interesses são mais nobres e justificam os meios para sua defesa”

Unidos por muito mais do que nossas necessidades pessoais, vamos nos articular para a defesa dos interesses coletivos, que àquela altura serão apresentados como ideais. 

Nesse momento, nos permitiremos agir com total bestialidade contras aqueles que nos ameaçam.

Alguns podem podem fazer sacrifícios pessoais pela causa, colocando suas vidas em risco.

Os que mais se destacarem na defesa dos ideais serão reconhecidos pelo grupo, os mortos serão honrados por sua total entrega, os vivos elevados à liderança para que zelem pelos ideais acima das necessidades individuais.

Apenas proteger suas necessidades básicas

Breaking Bad

Um professor de segundo grau que faz bicos para complementar a renda e sustentar sua família, descobre que sua esposa está grávida de um segundo filho, sendo que o primeiro tem problemas e que sua perspectiva de vida é curta devido a uma doença grave. 

Ninguém está passando fome, mas diante de sua possível morte, o protagonista Walter White estima que sua família vá precisar de 737 mil dólares para atender às necessidades básicas em sua ausência.

Assim, ele chega a conclusão que a única forma de alcançar esse valor no pouco tempo que lhe resta é produzindo e vendendo drogas. 

A ideia de que produzir e vender drogas é algo errado se justifica em nome de proteger a família.

Em algum momento da quinta temporada Walter White diz:

"Quando fazemos o que fazemos por uma boa razão, então não temos nada com o que nos preocupar e não existe justificativa melhor do que a família"

Walter White transita entre alguém que luta para prover sua família, bem como encontra nos desafios produção química de drogas a realização profissional que deixou passar em um momento de sua carreira.

A complexidade moral das escolhas que o personagem faz nos leva a revisar nossos julgamentos, fazendo da série um tremendo sucesso por nos permitir um exercício ético de alto calibre.

Breaking Bad” Family Values: Survival and the Slippery Slope | Roger  Williams University

Desejo de pertencimento e aprovação

GI Jane 

Do alto do jogo político dos Estados Unidos, uma senadora pressiona para mais presença feminina nas forças armadas. 

A fim de frustrar as intenções da senadora, uma tenente é inscrita no difícil treinamento das forças especiais com o objetivo de vê-la falhar em alcançar os requisitos para fazer parte da unidade de elite. 

A personagem de Demi Moore é submetida a condições intensas e luta para conquistar o reconhecimento de seus pares. 

Frases do filme:

60% de vocês não vão passar nesse curso!
Uma mulher não dura uma semana!
Como posso fazer parte deste grupo se vocês armaram para tudo dar errado?

Reconhecimento

Succession

Mesmo tendo tudo o que o dinheiro pode comprar, ou seja, suas necessidades básicas plenamente atendidas e o pertencimento que sua posição social lhes confere, os personagens da série estão em conflito pelo próximo degrau, o reconhecimento.

Acontece que o tão desejado reconhecimento só pode ir para um dos quatro filhos do magnata Logan Roy, daí deriva toda a tensão da série. 

A feroz luta pelo reconhecimento é uma luta por proximidade com o patriarca e pelas posições de destaque naquele universo quase distópico.

Succession é eleita a melhor série de 2021 pelo site Metacritic

De todas as associações possíveis entre os dramas da TV e do cinema com a teoria de Maslow, o filme À Procura da Felicidade é uma verdadeira aula de como a hierarquia das necessidades funciona.

⚠️

Spoiler alert!!

Se você não viu o filme, que foi lançado em 2006 e já passou em todo lugar, pare agora e vá assistir.

É uma obra incrível!

Na primeira parte do filme, vemos a família de Chris Gardner reunida para jantar.

Não há crise, eles possuem um teto, comida na mesa, roupas limpas.

Logo após o jantar, Chris se junta a seu filho para estudar.

Vemos aqui a preocupação com os meios de vida e remuneração no futuro.

O melhor caminho para não se ver desamparado é a educação.

Apesar da aparente tranquilidade, existem problemas.

Assim que coloca seu filho para dormir, Chris é confrontado por sua esposa. 

Ela está cansada de seus projetos mirabolantes, algo que podemos associar ao desejo de Chris por fazer algo que o realize.

Ele não está sendo bem sucedido, a família acumula dívidas e ela decide se divorciar. 

Chris ainda tenta levar uma vida normal sem sua esposa, mas tudo se complica quando ele não consegue ganhar dinheiro e são despejados de sua casa.

Nesse meio tempo, Chris se deparou com pessoas que pareciam felizes com suas vidas.

Ele pergunta o que elas fazem e quais os requisitos para fazer também e descobre que não existem restrições, basta que ele conclua um período de estágio não remunerado e seja aprovado num exame.

Vendo a possibilidade de atender às necessidades de sua família e ainda fazer isso com um trabalho que o realize, Cris se entrega ao desafio de ser aprovado.

Nessa parte do filme vemos todos os perrengues eles passam:

Dormir na rua

Manter uma rotina de estudos mesmo em uma situação tão precária

Sem tempo para o básico, Chris se desdobra em sacrifícios

Dentro do escritório as coisas são igualmente complicadas, ele não pertence àquele ambiente e deve se esforçar muito para conquistar o reconhecimento.

Situações constrangedoras nos fazem acreditar que ele não vai conseguir

Mas, em meio à toda turbulência, uma cena nos mostra a fonte de tanta motivação

Chris Gardner decidiu nunca se dar por vencido, não se conformar com as circunstâncias e transmite isso como lição para seu filho.

O fato de a conversa acontecer numa quadra de basquete no topo de um prédio, que dá a perspectiva da cidade, aumenta a intensidade, pois a cidade representa a opressão e a oportunidade.

Ao final, seu enorme esforço é notado e ele recebe uma proposta de emprego

A cena de alívio é a mais poderosa do filme.

Agora Chris poderá cuidar de sua família, fará isso pertencendo a uma prestigiosa firma de investimentos e poderá se dedicar a escrever sua própria história.

“Um escritor deve escrever para ser feliz” 

Casa, comida, tempo, estudos, sonhos realizados.

Os personagens se cruzam, com Will Smith passando pelo próprio Chris Gardner a caminho de casa num excelente bairro de São Francisco. 

Gostei, mas o que isso tem a ver com a área de influência?

Primeiro parabéns por ter chegado até aqui, você é uma pessoa tão dedicada quanto Chris Gardner e merece as recompensas de quem vai mais fundo.

Tão maior será a área de influência de um negócio quanto mais alto seu estágio na hierarquia das necessidades de Maslow.

Necessidades básicas = mercadinho de vizinhança

Proteger as necessidades = trabalho e moradia (o que muitas vezes representa deslocamentos entre os dois)

Pertencer e ser reconhecido pelo grupo = deslocamentos mais longos, frequência semanal.

Realização pessoal = as pessoas vão onde a oportunidade de realização estiver